quarta-feira, 21 de março de 2018

DUNGEON WORLD




Publicado no Brasil pela editora Secular Games, Dungeon World oferece um RPG genérico focado mais na interpretação do que nas regras. Um ótimo jogo, aliás. Ele usa um sistema de narrativa compartilhada, baseado no Apocalipse World, no qual o Mestre literalmente não rola dados, apenas os jogadores, e o cenário e o enredo é construído em conjunto com os jogadores.

Como isso acontece? Na verdade já assisti alguns jogos diferentes no YouTube com grupos diferentes e, fora a aplicação das regras, cada um o fez do seu jeito, cada um um pouco diferente, mas nem tanto. Então vou explicar como eu faço. Tenho uma primeira sessão com meu grupo, como sempre tenho, para criação dos personagens. No entanto, e aqui já começa diferente, nessa sessão inicial, também criamos o cenário. Cada um dos jogadores (incluindo eu, como mestre) oferece uma sugestão sobre alguma coisa no cenário e o grupo concordando, essa informação será uma verdade do mundo.



Essa sugestão pode ser qualquer coisa, por exemplo: no mundo não existem deuses (portanto nem clérigos); no mundo os orcs são escravos dos humanos; o mundo vive em eterna escuridão; o mundo está sendo consumido pela água após uso extensivo e indevido de magia durante uma guerra global e os sobreviventes estão explorando as luas daquele mundo através de navios voadores - essa se tornou uma verdade no meu grupo; no mundo só existem humanos; o Cthulhu é o imperador.

Enfim, pode ser literalmente qualquer coisa, desde que o grupo considere interessante.

Em seguida os jogadores criam seus personagens. O jogo oferece um grupo de classes clássicas (hue) de fantasia medieval, tal qual o ladino, o bardo, o bárbaro, etc e a ficha de duas páginas (de cada classe) lindamente traz em si todas as habilidades que o jogador poderá possuir, com suas descrições, do primeiro ao último nível!


Quando um jogador cria seu personagem, escolhe sua classe, ele também define o cenário. O jogador fez um clérigo? Ele vai dizer quais deuses existem no mundo, se um ou mais, como são cultuados - pelo menos o deus que ele segue - como são vistos pela sociedade, etc. Mesma coisa para cada classe, cada um vai descrever um pouco melhor o cenário. E o mestre, obviamente, vai utilizar essas informações para criar o enredo do jogo. O jogo te orienta a, inclusive,  quando preparar uma sessão, não preencher todas as lacunas, mas deixar várias delas em branco, sejam pedaços do mapa de uma cidade, construção ou masmorra. Dessa forma os jogadores vão narrar o que tem naquele lugar e consequentemente, o jogo também!


Quanto ao sistema o jogo trás um conjunto de regras bem simples e abrangente para todos, como ações de "matar e pilhar", "discernir realidades", "desafiar o perigo" e outros. E traz também, nas fichas de cada classes, as habilidades específicas delas com sua descrição completa do que ela faz ou não. Todo teste é feito pelos jogadores e nunca pelo mestre e possuem três níveis de sucessos: completo, no qual o jogador consegue realizar a ação que pretendia sem nenhuma adversidade (cada teste trás possibilidades diferentes sobre seus sucessos); sucesso parcial, no qual o personagem faz o que pretendia mas algo ruim acontece; e falha, onde ele se deu mal. E nas fichas, de classe e nas de ações básicas, contém tudo que se precisa saber sobre os testes, o que facilita demais.

As ações são todas descritivas. O mestre diz algo como "o orc parte para cima de você rosnando e com a arma em punho, o que você faz?" e o jogador determina sua ação. Não existem rodadas, ou iniciativa, os jogadores determinam. Se o jogador decidir, por exemplo, atacar o orc do exemplo acima e tiver um sucesso ele fere o orc e, se matá-lo, evita seu dano; se o sucesso for parcial ele acerta o orc, mas também é acertado por ele; e se for falha, apenas é acertado pelo orc. Mas ele poderia também fazer outras coisas como "defender" e com um sucesso completo não apenas se defender mas também abrir a guarda o inimigo, ou talvez ele prefira se esquivar e assim fazer um teste de "desafiar o perigo", podendo rolar ou saltar para longe do seu agressor, em um sucesso completo, ou se estatelar no chão indefeso caso tenha uma falha. Todas as rolagens de dados são feitas pelos jogadores, sejam as ações dos seus personagens, seja o dano que estão levando após uma ação parcial ou mal sucedida.




O sistema é feito para se viver uma grande aventura, não uma campanha de longa duração. É para se jogar um "O Senhor dos Anéis", não um "Supernatural", que tem 15 temporadas. Claro que nada impede de continuar jogando, mas o personagem ao alcançar o nível 10, se aposenta, passa o bastão para um aprendiz, ou muda de classe e começa do início novamente. Considerando as tantas possibilidades criativas a cada novo começo de jogo eu, particularmente, não vejo razão para prolongar algo. Planejo uma aventura de início, meio e fim, mesmo que grande, mas que caiba nessa progressão. Mas cada grupo pode fazer como bem entender, claro.

Preparar jogo para DW é uma coisa linda. Para começar, a maior parte do plot principal provavelmente virá dos jogadores durante a criação de personagem e de cenário. Se não vier, você está fazendo alguma coisa errada. E a criação de NPCs e inimigos é bastante simples, contendo cerca de meia dúzia de características, no máximo, e as motivações daqueles personagens ou criaturas.



Dito tudo isso, ele possivelmente não irá agradar a todos os jogadores. Ele possui uma dinâmica diferente da convencional; se tratando de fantasia medieval, oferece muito menos classes, raças e progressões do que o tradicional D&D; possui incomparavelmente muito menos regras; possui tão poucas regras e mecânicas que torna impossível personagens "combados" existirem - uma vez que essa não é a proposta.

No mais, super recomendo Dungeon World. O jogo proporciona, com sua narrativa compartilhada, experiências diferenciadas de RPG e, apesar de suas limitações, é extremamente divertido. Para quem possa interessar, eu publico os resumos das sessões que narro de DW aqui.


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